A UFPel, há mais de quatro décadas, disponibiliza aos seus discentes programas de Assistência Estudantil (AE), principalmente, os de moradia, transporte, atendimento biopsicossocial e alimentação. Certamente um número expressivo de estudantes formou-se na instituição por conta da utilização dos benefícios oferecidos pela AE e, provavelmente, boa parcela destes alunos poderia ter-se evadido antes da conclusão de seus estudos não fosse a existência dos programas.
A Pró-Reitoria de Asssuntos Estudantis (PRAE), atual gestora da Assistência Estudantil na UFPel, entende como oportuno e necessário ir ao encontro do caminho percorrido pela AE na Universidade, disponibilizando para a comunidade em geral uma parte importante da história educacional da instituição. Com esse objetivo, a PRAE deu início a um trabalho de pesquisa que pretende resgatar os principais fatos e iniciativas que assinalam a trajetória da assistência estudantil na história da UFPel.
Com a coordenação da pró-reitora Carmem de Fátima de Mattos Nascimento, o trabalho está sendo realizado pelo servidor José Leonel da Luz Antunez, hoje ligado ao IF-Sul (a partir da incorporação do Conjunto Agrotécnico Visconde da Graça), mas cedido à UFPel especialmente para este trabalho, em função de sua identificação com a área de assistência estudantil, da qual foi coordenador em gestões passadas.
“A UFPel, tradicionalmente, sempre esteve atenta às questões nacionais, regionais e locais em relação à Assistência Estudantil, e dessa forma, ininterruptamente, consolidou uma história respeitável na área, e não poderia deixar de registrar importantes ações voltadas a uma grande parcela de estudantes que passaram pela instituição”, justifica a professora Carmem.
Para Antunez, “retomar a história da Assistência Estudantil na UFPel é cumprir compromissos e prestar contas à comunidade, mas, antes de tudo, é um ato de justiça com todos aqueles que somaram esforços para minimizar as dificuldades enfrentadas pelos estudantes durante o percurso acadêmico”.
A Assistência Estudantil no Brasil
É quase impossível separar a Assistência Estudantil do Movimento Estudantil no país, até porque a União Nacional de Estudantes (UNE) nasceria dentro de uma casa de estudantes, na primeira metade do século passado no Rio de Janeiro, estabelecendo desde então uma relação, no mínimo, de muito comprometimento.
Consta que no período imperial (século XIX) surgem as conhecidas repúblicas estudantis em Ouro Preto-MG. Lá, estudantes com idéias republicanas foram morar nos casarões e sobrados, caracterizando na época uma importante ação política. A Assistência Estudantil no Brasil, no entanto, passa necessariamente pela criação da Federação dos Estudantes Brasileiros (FEB), em 1901; pelo funcionamento da casa do estudante brasileiro em Paris, em 1928; pela da criação da primeira casa do estudante do Brasil, em 1929, no Rio de Janeiro; e como, já citado, pelo surgimento da UNE, em 1937. Este período foi caracterizado por incentivos à moradia e alimentação para a classe estudantil.
Pode-se afirmar que boa parte das conquistas relacionadas à AE deve-se à atuação permanente do Movimento Estudantil, com destaque aos históricos enfrentamentos com os governos militares, de conhecidas consequências, na década de 1960.
Mesmo com o fim dos “anos de chumbo”, em meados dos anos de 1980 a AE não teria vida fácil nas universidades, pois, os restaurantes universitários e as casas de estudantes continuavam ainda a ser considerados ambientes que ameaçavam a ordem pública, pela facilidade em reunir estudantes. “Foi uma época de desatenção ou desleixo governamental com a AE, culminando com a desativação de algumas moradias e restaurantes”, pondera José Leonel Antunez.
É também verdade que neste período a AE ganharia três grandes reforços, pois, o MEC reativaria o Departamento de Assistência ao Estudante, em 1985, que nos anos 1970 era chamado Departamento de Assuntos Universitários (DAU). Os setores que tratavam do tema AE nas universidades federais passaram a promover encontros que culminaram na criação do Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace), em 1987. Neste mesmo ano, ocorre o surgimento da Secretaria Nacional de Casas de Estudantes (Sence), criada pelo Movimento Estudantil.
“Como resultado de importantes iniciativas em nível nacional, o Fonaprace impulsiona seus pleitos em prol da AE através da adequação de documentos e fundamenta-se em mais duas pesquisas do perfil socioeconômico, a de 2004 e 2010”, ressalta Antunez. Dessa forma chega, em julho de 2007, à proposta do Plano Nacional de Assistência Estudantil, que, somado ao apresentado pela Andifes, deu base à Portaria nº 39 do MEC, de 12/12/2007, atualmente oficializado como Política de AE , através do decreto nº 7.234, de 19/07/2010, que dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes).
A Assistência Estudantil na UFPel
A Assistência Estudantil na UFPel se dá na composição de ações realizadas pela antiga Universidade Federal Rural (UFRRS) e das faculdades anexas da UFRGS. Segundo o professor da UFPel Moacir Cardoso Elias (aluno da Faem em 1969), no Liceu Sul-rio-grandense moravam, na parte dos fundos, alunos do Curso de Agronomia, ainda como Universidade Rural, os quais apelidaram carinhosamente o alojamento de “Morcegueiro”, e as refeições eram realizadas em um refeitório adaptado dentro do prédio da Faem no então Campus Universitário, enquanto andavam as obras do RU definitivo.
A Faculdade de Odontologia, quando ainda pertencia à UFRGS, por determinação do então reitor Eliseu Paglioli, no final dos anos de 1950, disponibilizou 80 vagas de moradia e um refeitório em prédio contíguo ao da própria Faculdade, que atendia também aos estudantes do curso de Direito.
O decreto presidencial nº 62.178, de 25/01/1968, estabelecia a transferência do então Colégio Agrícola Visconde da Graça (CAVG), vinculado ao Ministério da Agricultura, para a (ainda) Universidade Rural. Já como UFPel, pelo decreto nº 56.881 de 16/12/1969, vincula-se definitivamente à instituição o CAVG, que oferecia cursos técnicos com 550 estudantes matriculados, destes, 250 eram do regime de internato (masculino) com infra-estrutura de 03 prédios de alojamentos e um refeitório.
Já no ensino superior, segundo relato escrito em 1993 pelo professor Gilberto da Costa Gigante, responsável pela Divisão de Assistência nos primeiros momentos de funcionamento da UFPel, a Universidade mantinha cinco casas para alojar os estudantes de fora de Pelotas. Essas casas apresentavam inúmeros problemas de manutenção e acompanhamento por parte da Universidade. Isso, pois, levaria a instituição, no ano de 1973, a locar o prédio de seis pavimentos na rua Andrade Neves, esquina General Telles, com 60 apartamentos sendo que em boa parte do térreo passou a funcionar o Restaurante Universitário. Originalmente, segundo o proprietário o prédio abrigaria uma maternidade, o que não chegou a ocorrer, assim então foi locado pela UFPel.
Ainda segundo Gigante, a portaria do Reitor, de nº 075/1973, estabelecia os objetivos da locação do prédio: “servir de moradia a estudantes do sexo masculino, carentes de recursos financeiros”. O artigo quarto do Regulamento limitava a distribuição de vagas a estudantes não domiciliados no perímetro urbano de Pelotas, possibilitando, assim, vagas para alunos oriundos do meio rural. As verbas para manutenção da Casa eram federais, além de utilizar recursos próprios da Universidade, dentre eles os obtidos com as taxas de inscrição dos vestibulares. Alunos eram contemplados com bolsa-auxílio, cujo valor era repassado à Universidade como parcela utilizada para cobrir custos de moradia e alimentação. Outra portaria estabelecia valores para o café da manhã, almoço e jantar, bem como, a mensalidade da moradia.
Conforme o professor da UFPel Jorge Martins (ex- morador), um fato que chamaria a atenção à época é que, em 1974, os estudantes invadiram o terceiro, quarto e quinto andares, ainda sem condições plenas, pois, não havia chuveiros e algumas pias. Mesmo assim, ocuparam as instalações devido à demora da autorização para a ocupação, pois alguns não tinham onde morar. A partir daí, o espaço é denominado Casa de Estudante Universitário (CEU).
Estes e outros depoimentos, que farão parte do livro, construirão a memória da Assistência Estudantil na UFPel, contemplando não apenas a moradia e alimentação, mas o auxílio-transporte.
Os organizadores da obra reconhecem que esta é uma área vital para a Universidade, que, por sua natureza, deve ter seu foco principal voltado às necessidades de seus alunos. Admitem que há muito ainda a fazer e conquistar junto ao Governo Federal para contemplar tais demandas, principalmente em face da expansão de alunos verificada com o Reuni (programa de reestruturação e expansão das universidades).
A PRAE está receptiva a outras colaborações por parte de antigos moradores da Casa de Estudantes da UFPel. Os depoimentos podem ser feitos à Pró-Reitoria de Assistência Estudantil – Coordenadoria de Benefícios, na avenida Bento Gonçalves, 3395, ou pelos telefones (53) 3222-4318, (53) 3227-8257.